A Vingança dos Autocolantes

Sempre que um café está para trespasse vai-se um pouco da alma do bairro. Vejo-os todos os dias. Os autocolantes do Sumol e do Bollycao. E um já gasto onde se lê Laranji... C. Em breve, vou deixar de ouvir o cumprimento repetido pontualmente às oito da manhã: «Bom dia, vizinha!» Mas eles hão-de continuar nas vidraças, a acenar-me e a pedir em tons amarelos e castanhos que coma o tal bolo com recheio de chocolate. Vou deixar de estar a par do resultado dos jogos do Benfica e do estado do tempo na margem sul. Mas o chocolate há-de continuar a escorrer no tal autocolante, indiferente a preferências clubísticas e à meteorologia. «Olhe que há muito trânsito na rotunda.» Sorrio sempre que noto que o «Sumol-Edição Especial Morangos» tem as pontas mais reviradas ou está prestes a descolar-se do vidro.
Amanhã... quando os dois miúdos da escola primária, tão pontuais como o cumprimento do Sr. Pedro, já tiverem os bolsos a transbordar de pastilhas Gorila, pergunto-lhe se posso descolar os autocolantes, colá-los no cimento e passá-los a ferro com o carro.